segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

Uma tarde na ópera Bastille, em Paris!

No domingo à tarde, 21 de janeiro, a turma do 10º ano da Secção Portuguesa teve a oportunidade de ir à ópera ver uma atualização da obra de Verdi, "La Traviata".

Foi um primeiro contacto com este tipo de espetáculo que permitiu conhecer Verdi, reconhecer algumas áreas particularmente conhecidas do grande público e refletir, posteriormente em sala de aula, sobre as relações homem-mulher. A versão da Traviata a que assistimos pôs em destaque a atualidade duma obra que nos chega do século XIX. “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, mas há comportamentos de tal forma enraizados que são recorrentes em várias sociedades, em várias épocas, em várias culturas. Esta atualização de “La traviata” mostrou-o particularmente bem.


Em 1853, estreia em Itália a ópera de Verdi, La Traviata, com um libreto que se inspira no romance de Dumas, A Dama das Camélias.

 

LA TRAVIATA de Verdi 

Em 1990, é publicado o romance de Paulina Chiziane, Balada de Amor ao Vento, cuja intriga decorre em Moçambique refletindo a história e cultura desse país africano.

 

Dois continentes, duas culturas: cem anos separam as obras que resolvemos aproximar durante algumas aulas de Literatura. O ângulo da nossa comparação foi a relação entre os homens e as mulheres. Foi assim que os alunos identificaram, primeiro, como são essas relações em cada obra, por separado. Num segundo tempo, procuraram identificar pontos em comum. O resultado da reflexão e da comparação está registado na tabela que se segue:

 

Balada de Amor ao Vento

de Paulina Chiziane

La Traviata

de Verdi

1.     As relações entre homens e mulheres regem-se como se se tratasse dum negócio/uma troca (pp. 40, 70);

2.     As relações homens/mulheres mudam com a presença de um filho (pp. 101-102);

 

3.     a mulher é submissa ao homem, deve cuidar dele (cap. 5, pp. 47-48 - os conselhos da rainha a Sarnau, preparar o banho quente para o marido e para a amante…); deve realizar todas as tarefas domésticas sem reclamar (cap. 5, pp. 47, 51: “ Sarnau (...) e tu serás a serva obediente, escrava dócil, sua mãe, sua rainha”, “Sarnau, partes agora para a escravatura”);

 

4.     O facto da Sarnau não ser respeitada pelo Nguila fez com que ela, mulher, se sentisse só e abandonada: “Sinto-me tão só e abandonada. Ainda há quem inveje a minha posição, pois dizem que sou rainha, mas que grande deceção” (p. 80, cap. 8);

 

5.     O abuso físico/a violência da mulher por parte do homem é visto como uma prova de amor, é aceite socialmente (Sarnau sofre abuso físico pelo marido e dizem que é porque ele a ama (cap. 5, p. 47) “Se ele, furioso, agredir o teu corpo, grita de júbilo porque te ama”)

 

6.     A mulher casada pertence à família do marido (cap. 5, p. 51) “as minhas mães amparavam-me enquanto faziam a minha entrega aos novos donos”.

 

 

1.     Violeta é, como prostituta, uma mulher-objeto, inferior ao homem (Alfredo não é mal visto socialmente, nem ele nem os outros homens que frequentam as mesmas festas que as mulheres: perante comportamento idêntico, à discriminação da mulher não corresponde a discriminação do homem);

 

2.     Violeta é popular, independente, toma as suas decisões sem consultar Alfredo (frequenta as festas, está muito presente nas redes sociais, é respeitada pelos populares que com ela frequentam as festas…)

 

3.     Violeta é também uma mulher submissa aos homens (ao serviço deles quando obedece ao Pai de Alfredo);

 

4.     A violência no relacionamento entre homens e mulheres é muito mal vista na sociedade da Traviata (quando o Alfredo atira o dinheiro na cara da Violetta suscita reações de condenação).

 

 

PONTOS EM COMUM

·   A família interfere na relação do casal Alfredo/Violetta, Mwando/Sarnau e Nguila/Sarnau (Violeta é de baixa categoria social e não convém ao pai de Alfredo porque está a comprometer o casamento da irmã de Alfredo com o príncipe saudita; os pais de Mwando escolhem a mulher com quem o filho casa; a rainha mãe escolhe Sarnau como esposa do filho por ela ser pura e generosa);

 

·       As relações sexuais com prazer (para o homem) acontecem com prostitutas;

 

·  O amor surge como impossível (Alfredo/Violetta; Mwando/ Sarnau) por motivos alheios à vontade do casal (nível social; religião);


·        O homem submisso não é bem visto em ambas as obras: Mwando submeteu-se à sua mulher e isso foi julgado por todos os homens e mulheres da aldeia “No teu lar, semeias a preguiça, a vaidade e a insolência”.  (Cap. 7, p. 72); o Pai de Alfredo sente que o filho está submisso a Violetta porque está por ela apaixonado e mantém a relação com ela, por isso tenta interferir nessa relação para que termine. Em ambas as obras, por causa das aparências, não fica bem um homem fazer tudo por uma mulher;

 

·        Para um comportamento idêntico, homens e mulheres não são “avaliados” da mesma forma: na obra moçambicana vemos que Nguila pode ter várias mulheres e não há problema, o mesmo se sente em La Traviata; em contrapartida a mulher que tem vários parceiros já é condenada pela sociedade, vêmo-lo na condenação feita a Violetta (a cortesã, a mulher da má vida que pelo seu comportamento pode impedir o casamento da irmã de Alfredo) e também vemos na perseguição feita a Sarnau pelo marido Nguila quando este sabe que houve adultério por parte da mulher.

 

 


 




 


Nenhum comentário:

Postar um comentário

O teu comentário será publicado após validação do proprietário do blogue.